Por Suhely Bueno
Confesso que não paro de pensar no Kirk. A cena chegou às redações logo que aconteceu, e a imagem não sai da minha cabeça. Como jornalista, já vi muita coisa, mas há momentos em que a profissão esbarra dolorosamente na nossa condição humana.
Que sociedade estamos construindo? Que tipo de pessoas estamos formando? O caso do Kirk, ontem a jovem ucraniana... A sucessão de barbáries nos faz questionar o que aconteceu com essa coisa chamada humanidade. E nós, da imprensa, muitas vezes nos vemos no centro de uma encruzilhada ética complexa: entre defender ou demonizar vítimas, correndo o risco de nos tornarmos mais um elemento dessa violência desmedida que assola nossos dias.
O Dilema de Quem Relata a Dor
Escrevo como alguém que tem a obrigação profissional de cobrir esse tipo de matéria. Mas ao final do dia, quando as câmeras se desligam e os microfones se calam, é a parte humana que clama. É a sensibilidade materna que se revolve. É a busca pela verdade que grita mais alto e se recusa a aceitar a impunidade.
Existe uma tensão constante entre a jornalista que não pode se calar - aquela comprometida com a verdade - e a pessoa que simplesmente chora, teme e ora diante de tanta crueldade. Como equilibrar o dever de informar com a necessidade de preservar nossa própria humanidade?
A imprensa tem um papel fundamental na construção de uma sociedade mais justa, mas também carrega o peso de ser, por vezes, cúmplice involuntária da espetacularização da violência. Quando noticiamos essas tragédias, caminhamos numa linha tênue entre informar o público e alimentar um ciclo perverso de consumo do horror.
Por isso, esperamos que algo maior que nós esteja observando. Que Deus esteja olhando por todos nós e tocando corações diante de tantas atrocidades. Que a justiça divina venha, sim, mas que a justiça humana - aquela que se materializa nas leis, nas instituições, na educação e na transformação social - também se faça presente e prevaleça.
Diferente da velha mídia que muitas vezes se curva a interesses e conveniências, não compactuamos com inverdades. Nosso compromisso é com a verdade, doa a quem doer. Não há espaço para meias palavras quando vidas estão em jogo, quando a justiça é negada, quando a sociedade se desumaniza.
O jornalismo verdadeiro não pode se calar diante da barbárie, mas também não pode se vender ao melhor lance ou se render à pressão de grupos poderosos. Nossa missão é informar com honestidade, esclarecer sem omissões e contribuir para uma sociedade melhor, mesmo quando isso significa carregar imagens que não saem da cabeça e enfrentar verdades incômodas.
Que nossa indignação se transforme em combustível para um jornalismo mais íntegro, mais corajoso e mais comprometido com a verdade absoluta. Porque no final das contas, somos todos vulneráveis a essa violência que parece crescer a cada dia - e é nossa responsabilidade profissional e humana dizer a verdade, custe o que custar, incomode a quem incomodar.